A Viagem de Chihiro | Crítica

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A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no Kamikakushi, 2001) é uma animação japonesa do mestre Hayao Miyazaki de outros longas como Meu Amigo Totoro (1988) e Ponyo (2008). Também famoso mundialmente pelo título Spirited Away, o filme tem grandes premiações no curriculum como o Oscar de Animação 2003 e Urso de Ouro no Festival de Berlim 2002. Merecido reconhecimento ao Studio Ghibli.

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Chihiro é uma mimada criança que está se mudando para outra cidade contra sua vontade. Durante o trajeto seu pai erra o caminho e eles chegam num vilarejo aparentemente abandonado e vão explorar o local contra a vontade da menina ranzinza que sente falta da vida antiga e que está morrendo de medo. Eles se deparam com um farto banquete e fica difícil de resistir na medida em que sentem muita fome, e após atacarem a comida seus pais são transformados em porcos! Cabe então a Chihiro buscar uma solução para essa situação bizarra enquanto luta pela própria adaptação nesse novo e fantástico local.

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Sem ser moralista, o filme impõe lições básicas fundamentais com críticas certeiras, mesmo pegando leve. Chihiro não se corrompe na sua jornada, não que tenha sido fortemente testada, mas sim porque é uma criança que apesar de chatinha tem uma noção clara do que ela realmente precisa, e mesmo tendo seu nome quase roubado é uma criança determinada. Consumismo e adoração ao bem material também estão presentes nesse contexto.

Como fantasia a animação também se destaca. A fotografia é um deleite e os cenários são ricos e cheios de sutilezas ao mesmo tempo. Efeitos simples como um vento batendo no rosto ou um reflexo no retrovisor são complementados pela linda trilha sonora (Joe Hisaishi) que é sentimental mas não forçada. O roteiro escorrega apenas no desfecho do personagem Hako, não por ser ruim mas por ficar a sensação de que ele merecia aparecer mais um pouco.

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A Viagem de Chihiro merece ser visto e quem é fã de desenhos vai curtir, assim como a criançada e os pais. É uma boa alternativa a quem busca uma boa história além das animações americanas que buscam a perfeição estética, e também aos desenhos japoneses do estilo Naruto ou Pokémon.

Nota: 10 – Excelente!

Sen to Chihiro no Kamikakushi, 2001

Direção/Roteiro: Hayao Miyazaki

Japão

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O Sétimo Selo | Crítica

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 “Devemos fazer de nosso medo um ídolo e chamá-lo de Deus?”

     O diretor Ingmar Bergman enfrentou seu medo da morte em O Sétimo Selo (Det Sjunde Inseglet, 1957). Numa obra repleta de questionamentos acerca da existência divina e vida eterna, o sueco reflete sobre o tema com muita abrangência enquanto nos mostra uma terra devastada pela peste negra no século XIV.

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     Antonius Block (Max Von Sydow) é um cavaleiro que após retornar das Cruzadas junto de seu escudeiro Jons (Gunnar Björnstrand) encontra seu país devastado pela peste negra. Enquanto reflete acerca da existência divina, a morte em pessoa vem busca-lo pois chegou a sua hora. Querendo ganhar tempo pois suas dúvidas ainda não foram respondidas, Antonius desafia a Morte (Bengt Ekerot) para um duelo de xadrez, onde ele viverá caso vença a partida.

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     A inspiração para o filme foi uma peça teatral, produzida pelo próprio diretor que também era professor na Escola de Teatro de Malmö na Suécia. A influência das artes cênicas é fortíssima no filme, desde seu cenários, diálogos e até a trupe de artistas que tem participação muito importante na história.

     A reflexão proposta por Ingmar Bergman no filme foi muito ousada para a época. A relação Deus e homem em forma da autoflagelação para expiar os pecados, o propósito da oração e até a benevolência divina é posta em xeque. Nesse sentido as referências bíblicas principalmente do Livro do Apocalipse se fazem necessárias, e elas estão presentes de diversas maneiras. Além do cavaleiro em busca de respostas e da Morte temos o escudeiro ateu, o artista que consegue enxergar a sentir a presença divina, a já citada Opus Dei, a multidão acusadora e a bruxa. Repare que o divino praticamente não toma forma, mas em nome da religiosidade as pessoas são capazes dos maiores absurdos imagináveis.

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     O desempenho de Max von Sydow e Bengt Ekerot são memoráveis, seus diálogos são poderosos e destoam do aspecto teatral que as vezes passa pelo filme. As músicas são belas e impactantes, principalmente na chegada dos flagelantes. A famosa cena da “Dança da Morte” também impressiona. A amizade entre Block e o casal de artistas gera estranheza por ser um pouco apressada, mas o humor também está presente na maioria das vezes de forma sutil (na hora de escolher a cor para a partida de xadrez a Morte sai com a cor preta!) Mesmo o desafio do tempo para essa filme de 1957 é vencido com maestria, O Sétimo Selo merece ser visto assim como toda a obra do diretor Ingmar Bergman.

Nota: 10 – Excelente!

Det Sjunde Inseglet, 1957

Direção/Roteiro: Ingmar Bergman

Suécia

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(500) Dias com Ela | Crítica

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“A história do garoto que conhece a garota.”

     Você acredita no amor verdadeiro? O estreante diretor Marc Webb propõe uma visão muito particular sobre o assunto, mas que milhares de pessoas irão se identificar. Divertido e dinâmico, (500) Dias com Ela (500 Days of Summer, 2009) é a forma mais honesta do amor moderno retratado no cinema.

     Na trama acompanhamos Tom (Joseph Gordon-Levitt), um frustrado criador de cartões comemorativos e seus momentos com Summer (Zooey Deschanel), uma garota que ao contrário de Tom, não acredita no amor.

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     A relação entre Tom e Summer é contada de forma não linear do ponto de vista do primeiro, muitas vezes fazendo um paralelo de como uma mesma situação tem impacto diferente dependendo do estágio do relacionamento. Hora a garota está meiga e amável, mas do nada se torna ríspida e indiferente. Há diversas homenagens a filmes clássicos que abordam o tema como o excelente Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1977) do diretor Woody Allen (na ótima cena “expectativa x realidade”) e até A Primeira Noite de Um Homem (1967) de Mike Nichols, só para citar alguns.

     O par formado por Joseph Gordon-Levitt e Zooey Deschanel está muito bem entrosado. É interessante observar a evolução de cada personagem, já que em certo momento haverá uma inversão de valores entre eles.  O fato de Rachel (Chlöe Grace Moretz), que é apenas uma criança ser a principal conselheira de Tom, mostra quão inocentes os adultos podem se tornar na vida amorosa, méritos para a atriz mirim que faz uma participação agradável. Também para compor o conselho do jovem apaixonado estão seus amigos Paul (Matthew Gray Gubler) e McKenzie (Geoffrey Arend), além de seu chefe Vence (Clark Gregg).

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     A câmera de Marc Webb trabalha muito bem. Seus diversos trabalhos como diretor de videoclipe são testados aqui, com direito a um trecho no estilo musical. Apesar de não ser fã do estilo, me agradou bastante e se encaixa bem no contexto do filme. A cena em que Tom canta “Here Comes Your Man” do Pixies é muito legal e referências musicais vindas de bandas como The Smiths se fazem presentes.

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     (500) Dias com Ela não é uma história de amor. Marc Webb deixa isso claro logo no início, escancarando com objetividade a mensagem do filme. Por mais que o par romântico entre Tom e Summer renda cenas inesquecíveis, não espere um desfecho tradicional aqui. Porém, se em determinado momento o diretor ironiza a questão do amor verdadeiro, a falta de sintonia entre as crenças de cada personagem faz a situação parecer algo do destino.

Nota: 10 – Excelente!

(500) Days of Summer, 2009

Direção/Roteiro: Marc Webb, Scott Neustadter e Michael H. Weber

Estados Unidos

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O Homem que Virou Suco | Crítica

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“Por que você não faz como meu marido, seu Deraldo?  Que levanta seis da manha pra trabalhar e só volta de noite, cansado.”

     O Homem Que Virou Suco (1980) é inteligente e atual. Mesmo com a devida mudança inevitável de três décadas, é fácil encontrarmos mais do que meia dúzia de semelhanças entre a época que se passa o filme e os dias de hoje. Num filme que correu o risco de morrer devido ao pequeno público da estreia, temos aqui a representação do que foi e ainda acontece na vida muitos nordestinos na cidade de São Paulo, podendo incluir nessa lista outras grandes cidades e metrópoles do sul do Brasil.

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     Deraldo (José Dumont) é um nordestino que chegou faz pouco tempo na capital paulista, e tenta ganhar a vida como poeta popular. Após ser confundido com um assassino procurado por matar o patrão de uma empresa multinacional, ele é obrigado a fugir já que ainda não possui documento para identificação. Ao mesmo tempo em que luta por sua inocência, Deraldo precisa encontrar uma forma de ganhar dinheiro através do trabalho para não passar necessidades.

O enredo nos leva aos mais diversos lugares da cidade, cada um com sua importância na magnífica epopeia do protagonista. Deraldo tenta trabalhar descarregando sacos de cebola mas não consegue dar conta do serviço que é muito pesado. Vai então trabalhar numa construção, onde enfrenta a linha dura do supervisor (também nordestino) e acabam se desentendendo. Também vai parar nas obras do METRO, onde os operários são preparados para o trabalho com ameaças humilhantes e xenofóbicas contra qualquer rebeldia.

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     Mesmo sendo um ninguém (civilmente falando) Deraldo renega a todas as situações que lhe sujeitam. A transformação do homem em coisa, um ser que trabalha até a exaustão e carece de tempo para si não combina muito com a sua personalidade. Então é conveniente que ele seja confundido com um bandido e sua ocupação por vocação seja a poesia, que é vista como profissão de vagabundo por muitos na sociedade. A crítica ao sistema industrial caminha junto com a ideia de desumanização da fatia menos favorecida da sociedade. É importante observar também que o personagem em momento algum é corrompido por esse sistema.

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     Vital Farias assina a trilha sonora e os textos poéticos, que estão excelentes e se sobressaem na falta de uma qualidade melhor na filmagem (o filme passou por um processo de restauração e foi relançado em 2007), com poemas sutis e músicas típicas nordestinas, que tem a participação de Dominguinhos. Apesar de algumas soluções clichês no roteiro, elas são bem usadas pelo diretor João Batista de Andrade e os demais elementos da produção dão conta do recado. O Homem Que Virou Suco venceu o tempo, mesmo o ideal sendo ele cair no esquecimento caso os problemas sociais apresentados sejam resolvidos.

O Homem que Virou Suco, 1980

Direção/Roteiro: João Batista de Andrade

Brasil

Nota: 10 – Excelente!

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Depois de Lúcia | Crítica

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     O bullying faz parte do grupo de temas que estão sempre gastos e ao mesmo tempo muito atuais, devido à sua perpétua presença nos ambientes escolares. Essa situação é mais grave ainda em países de economia emergente, os chamados países em desenvolvimento. Depois de Lúcia (2012) relaciona esse tema juntamente com o luto que os protagonistas enfrentam, mostrando algumas facetas do ambiente que os cerca como hipocrisia, legislação falha e crueldade.

     Após a morte de Lúcia, mãe e esposa de Alejandra (Tessa Ia) e Roberto (Hernán Mendoza), pai e filha se mudam de Vallarda para Cidade do México em busca de um recomeço para suas vidas. Enquanto Roberto tenta se estabelecer como chef de restaurante, Alejandra se enturma com os colegas na nova escola. Mas um deslize por parte da garota inicia uma série de atos humilhantes sofridos por ela em seu novo colégio.

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     Por mais que o filme justifique o que acontece com Alejandra como uma penitência que ela impõe a si mesma diante do luto, é difícil de aceitar que esses casos ocorram da forma que é retratado, e a lista é repleta: vídeos e fotos difamatórias publicados na internet, agressão e humilhação física, perseguição psicológica e abusos sexuais. Nesse ponto o diretor Michel Franco corre o risco de mostrar algo com doses inverossímeis, mas suas intenções se tornam legitimas a partir do momento que o filme tenta passar sua mensagem crua e violenta. Não há muito o que fazer para resgatar pessoas desorientadas de tal forma com a vida. A escola pode até inibir de certa forma o uso de drogas através de testes toxicológicos, mas não é capaz de fazer o mesmo com o bullying.

     A câmera fixa junto com os planos longos e sequência retrata bem Roberto, que não consegue lidar com o fardo que carrega e caminha gradativamente para a explosão. De poucas palavras e as vezes até monossilábico, não é capaz de compreender o que realmente se passa com sua filha pois ele também precisa de amparo. Essa ajuda não vem, visto que até para receber o seguro do acidente que vitimou Lucia ele precisa descrever minuciosamente numa folha de papel o que foi feito com o corpo da sua mulher morta. É uma forte tortura psicológica em nome da burocracia.

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     Inteligente em chocar o luto hora com o bullying, hora com a negação, Depois de Lucia é violento e não anestésico podendo causar rejeição pelo seu tom exagerado, mas abre espaço para discussões sociais e familiares como comunicação entre pais e filhos, hipocrisia e o próprio bullying, que não pode deixar de ser abordado enquanto estiver presente de forma tão enraizada, seja na Cidade do México ou no resto do mundo.

Nota: 8 – Muito Bom!

Después de Lucía, 2012

Direção/Roteiro: Michel Franco

França / México

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Rede de Intrigas | Crítica

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“Essas coisas que acha que são piegas, minha geração chama simplesmente de decência humana”

     Quando o cidadão chega em casa entre as 17 e 19hs após uma longa e cansativa jornada de trabalho, o mais comum é ligar a TV após o banho e esperar pelo jantar. Qual programa ele vai ver? O que mais lhe chamar atenção, obviamente. Rede de Intrigas (Network, 1976) trata exatamente dessa busca incessante pela audiência e seus bastidores na forma de sátira, apontando o dedo na cara das gerações alienadas pela mídia.

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     Howard Beale (Peter Finch) é apresentador do noticiário da rede UBS, e tem sua demissão anunciada devido à necessidade de reformulação no jornal devido aos baixos índices na audiência. Enlouquecido e sem saber o que fazer após perder o emprego que representa tudo na sua vida, Howard promete se matar ao vivo no seu derradeiro programa do dia seguinte. Essa atitude atrai a curiosidade do telespectador e garante a continuidade dele no noticiário, que logo se torna num show de entretenimento para quem assiste e tem na figura do ancora uma espécie de profeta louco.

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     Qualquer semelhança com programas como Cidade Alerta ou Brasil Urgente não é mera coincidência, o tema do filme é muito atual e tende a ser por muitos anos. A reação do protagonista foi inspirada no caso da jornalista Christine Chubbuck que se suicidou ao vivo na TV quando estava sendo demitida por motivos semelhantes. O noticiário se torna um show de entretenimento em prol dos pontos audiência, tendência que se prolifera a todos os programas e para conseguir esse objetivo vale até desrespeitar as leis e o bom senso.

     Os diálogos são muito técnicos e isso ajuda a destacar os desabafos de Howard. O Oscar póstumo de Peter Finch se justifica nesse personagem surtado que passou por muitas transformações, mas podemos destacar positivamente outros como Frank Hackett (Robert Durval) e Diana Christensen (Faye Dunaway) que tem o mesmo objetivo prático mas com fins diferentes, ambos querem aumentar a audiência mas enquanto o primeiro precisa mostrar lucros para os acionistas, a outra quer reconhecimento e sucesso. Diana chama atenção pelo que ela representa: a geração dominada pela mídia, viciada no trabalho (tudo q ela quer são muitos pontos de audiência), péssima nos relacionamentos e no sexo, fala sobre o trabalho até na hora de transar! Não é capaz de se apaixonar por ninguém sem estar afetada por esse domínio. Isso torna seu par romântico superficial demais. Max Schumacher (Wiliam Holden), charmoso e eloquente no seu fim de meia idade, é o homem que se salva desse processo, que consegue conviver com isso sem deixar de ser humano, inclusive com seus defeitos e manias como abandonar sua família para viver com outra mulher. O difícil é acreditar que ele seja capaz de amar uma pessoa tão intragável como Diana. Faltou um pouco mais da amizade entre Howard e Max na segunda metade do filme.

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     O diretor Sidney Lumet tinha facilidade em trabalhar temas que levam o ser humano a olhar para si e refletir a respeito do que vem fazendo com a sua limitada permanência no planeta, assim como abordava bem os limites que uma pessoa pode chegar para conquistar seu objetivo. Foi assim desde seu debute em 12 Homens e Uma Sentença (1958). Em Rede de Intrigas ele expande o alcance dessa mensagem ao mesmo tempo que apresenta outras facetas humanas, como o megalomaníaco dono da grande empresa Arthur Jensen (Ned Beatty), que não enxerga mais nações ou pessoas, apenas IBM, At & T etc. Repare na expressão fascinada de Howard quando Jensen expõe seus pensamentos, é o poder financeiro vencendo qualquer reação humana a esse processo de emburrecimento. O Deus fast food é adorado a muito tempo, e a cada dia consegue novos adeptos.

Nota: 8 – Muito Bom!

Network, 1976

Direção/Roteiro: Sidney Lumet e Paddy Chayefsky

Estados Unidos

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Pulp Fiction – Tempo de Violência | Crítica

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   “Zed’s dead, baby. Zed’s dead.”

      Como se chama o quarteirão com queijo na França? E o Big Mac? Em Pulp Fiction – Tempo de Violência (1994) Quentin Tarantino atingiu o que para muitos foi o ápice de sua carreira. Trabalho posterior a Cães de Aluguel (1992) e ainda na política do bom e barato (não custou mais do que US$10mi para uma arrecadação de mais de US$200mi), o filme foi inspiração para cineastas como Robert Rodrigues e Guy Ritchie, além de dar outra cara aos filmes independentes.

     São três histórias paralelas, mas não cronológicas que se cruzam em determinado momento. Primeiro somos apresentados a Jules Winnfield (Samuel L. Jackson) e Vincent Vega (John Travolta), dois assassinos profissionais a serviço de Marsellus Wallace (Ving Rhames). Na segunda história Vincent Vage leva Mia Wallace (Uma Thurman), esposa do seu chefe, para se divertir a mando do mesmo. Por último, Butch Coolidge (Bruce Willis) é um pugilista em decadência que foi comprado por Marsellus para perder uma luta, mas não cumpriu sua parte no acordo e agora precisa fugir.

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     Tendo como temática as revistas pulp antigas, com histórias absurdas impressas em papel de baixa qualidade, fica difícil elaborar um roteiro lidando com tantas histórias malucas simultaneamente. Não é o que parece para Roger Avary e Tarantino. Tudo corre de maneira coesa e natural, e mesmo o mistério da maleta serve apenas para enriquecer a história. Os diálogos são cativantes, com muito humor e esperteza. Sutilezas que interpretamos como alivio cômico pode significar muito mais do que imaginamos, como a cerveja servida no copo de vidro no cinema de Amsterdã. São coisas que servem para a afirmação desses personagens, que carecem de uma estrutura para definir quem são e o que realmente tem valor para eles. Quem mais se transforma nessa condição é Jules e Butch. O primeiro passa a ter uma percepção nova de sua situação ao escapar da morte quase certa, acreditando se tratar de uma intervenção divina. Já o personagem de Bruce Willis consegue sua redenção ao superar seu inimigo salvando a sua vida, e não usando os mesmos métodos dele (apesar de ter tentado), e é nele que está presente a mensagem mais positiva possível nesse filme. Notem também a total ausência da polícia no filme, exceto pela participação de Zed (Peter Greene), que é na verdade um segurança. Nessa ausência de referencias, é Marsellus quem comanda.

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     O elenco se sai muito bem, desde o resgate de alguns atores com a imagem um tanto abalada como John Travolta, Samuel L. Jackson e Bruce Willis, até a repetição de alguns que trabalharam com Tarantino em Cães de Aluguel como Harvey Keitel, Tim Roth e Steve Buscemi (participação breve). Uma Thurman foi a grande revelação com sua entediada e louca Mia Wallace.

     A trilha sonora possui um coração à parte, dando uma personalidade única ao filme. Musica surf logo nos créditos iniciais, também temos a inesquecível dança de Uma Thurman e John Travolta ao som de Chuck Berry, e “Girl, You’ll Be A Woman Soon” da banda Urge Overkill em contraste com uma overdose.

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     Quem não teve a oportunidade de conferir essa obra prima do cinema recomendo que encontre um tempo livre na agenda, pois trata-se de um trabalho acima de qualquer avaliação (mesmo que seja para não gostar depois). Você pode estar sendo influenciado por esse filme sem mesmo se dar conta, a série Breaking Bad por exemplo usa técnicas muito parecidas de fotografia e diálogos. A lista é imensa. A diversão também.

Nota: 10 – Excelente!

Pulp Fiction, 1994

Direção/Roteiro: Quentin Tarantino e Roger Avary

Estados Unidos

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Fome | Crítica

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     Fome (Hunger, 2008) não é um filme fácil de ser acompanhado e também não é para qualquer um. Desde as cenas cruas e cruéis e violência até as longas tomadas dos seus noventa minutos de duração, exige uma paciência maior do expectador, e também boa vontade com o fato histórico inspirador do roteiro, que até fica explicado, mas com o cuidado de não soar professoral no seu tom, que busca mais a condição do ser humano.

     Após ter sido retirado seu status de presos políticos, o grupo paramilitar católico IRA (Irish Republican Army) e seus integrantes passam a serem considerados prisioneiros comuns no temível Maze Prision em Belfast, Irlanda do Norte no fim da década de 70. O acontecimento gera proporções fortes, e através do líder Bobby Sands (Michael Fassbender) o grupo promove os protestos do cobertor, que consistem em não usar roupas de criminosos, nada de banho, nem barba e cabelos cortados. A greve de fome que inspira o nome do filme é a derradeira manifestação em vida de Bobby Sands, que ali lutou para que, além dos direitos políticos, seus iguais fossem tratados como seres humanos.

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     Steve McQueen estreou muito bem com esse filme, usando a guerra civil irlandesa como pano de fundo para mostrar alguns extremos da condição humana. Apesar de um trabalho de estreia, o diretor pisa em local conhecido ao retratar o que é feito com as fezes dos prisioneiros, assim como a urina e os restos de comida, já que o diretor também é artista plástico. E vemos a divulgação do seu trabalho por todo canto, num cenário de verdadeiro caos e violência que pode chocar os mais suscetíveis.

Michael Fassbender é a grande estrela, esse filme abriu portas para o ator em Hollywood, e aqui ele se doa totalmente. Dos espancamentos à sua aparência esquelética, ele retrata Sands de maneira firme e obstinada, sem apelar para discursos motivacionais ou outros clichês possíveis. Alias, o filme possui poucos diálogos, é dito precisamente o que é necessário para o entendimento, com exceção à conversa de Bobby com o padre Dominic Moran (Liam Cunningham), onde as palavras correm tão rapidamente que fica difícil de acompanhar. Em nível de elenco também podemos elogiar Stuart Graham que interpreta o policial Ray Lohan e tem uma marcante cena de abertura (repare em seus métodos domestico ortodoxos tipicamente policiais em comparação com sua mão machucada devido às sessões de tortura).

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     Podemos concluir que Fome se trata de uma experiência difícil, mas prazerosa e de um talento grande por parte dos envolvidos. O diretor nos mostra os fatos sem tomar partido, mas retratando muito bem como foi conduzida a situação naquele cenário especificamente, que juntamente com a atitude de Bobby Sands, é o que interessa realmente nesse trabalho.

Nota: 8 – Muito Bom!

Hunger, 2008

Direção/Roteiro: Steve McQueen e Enda Walsh

Reino Unido

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Junho – O Mês Que Abalou o Brasil | Crítica

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V de Vinagre

   Chego no caixa do cinema no Shopping Bourbon de São Paulo e peço ingresso para assistir Junho, a atendente nem sequer sabe que o filme está em cartaz e olha pra mim como se eu fosse louco (deve ter ficado lelé da cuca de tanto vender X-Men e Malévola). Após a confirmação de que mantenho minhas faculdades mentais, eu e meu amigo Felipe entramos na sala com um “incrível” público de no máximo oito pessoas. Um retrato do gigante que voltou a dormir? Ou ele nunca dormiu?

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     Junho – O Mês Que Abalou o Brasil (2014) é um documentário que tenta retratar o que diabos se passou nessa época no ano de 2013, pré e durante a Copa das Confederações organizada pela FIFA no país. Apesar do evento esportivo, que causou e causa revolta pelo maltrato do dinheiro público, o fato que marcou o início dos protestos foi o aumento na tarifa de ônibus na cidade de São Paulo, onde o MPL (Movimento Passe Livre) reivindicava a revogação desse aumento. Outro fato marcante foi a repressão e despreparo policial, gravada de diversos ângulos através das câmeras nas ruas.

     O documentário retrata muito bem o que ocorreu, a narrativa organiza o período de acordo com os dias, como o histórico dia 17 de junho, onde dezenas de cidades e milhões de brasileiros foram às ruas, numa indignação cheia de misturas: preço da passagem, saúde e educação precária, corrupção, “[adicione aqui a sua indignação]”. É abordada essa disparidade de opiniões e causas, inclusive o choque desses pontos de vista.

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     Produzido pela Folha, estava curioso se eles (da imprensa) iriam assumir que foram a favor dos abusos por parte dos policiais, inclusive cobrando mais rigor em suas ações insinuando uma certa frouxidão. Eles assumiram o erro, mas com um pouco de maquiagem numa compreensível puxada de sardinha: é fácil citar Arnaldo Jabor e não Sérgio Dávila que escreveu a coluna “Retomar a Paulista”, discordo também de que a imprensa teve um papel fundamental na conquista da revogação do aumento na tarifa de ônibus. Ao contrário, o movimento deu um tapa na cara da imprensa como um todo, que quis marginalizar de forma generalizada as manifestações, e depois voltou atrás. Faltou uma compreensão maior a respeito das pessoas que gritavam “sem partido” frente ao oportunismo do PT em querer tomar para si uma vitória da população não politizada. A triste realidade é que o brasileiro é ignorante demais para ser fascista.

     Bem lembrado alguns bordões da época como “amanhã vai ser maior”, “sem violência” e também os diversos trocadilhos sobre o tal “Padrão FIFA”, “V de Vinagre”. Muitas piadas viralizaram nas redes sócias, que teve papel fundamental como meio de comunicação para os participantes através de gravações feitas por celular, imagens e até agendamento de novos protestos. Por fim somos lembrados que na periferia as balas não são de borracha, onde a violência por parte das autoridades é muito maior, e o descaso também. O paralelo feito com acontecimentos do futebol com a situação de muitos setores públicos em decadência é engraçado e triste ao mesmo tempo.

     Pode até ser um pouco cedo para tirar conclusões mais definitivas sobre o ocorrido, mas com suas devidas ressalvas o filme cumpre dignamente seu papel, que deveria a partir do minuto de lançamento fazer parte do programa escolar da nossa educação, se eu fosse professor meus alunos com certeza iriam conhecer esse filme. Parece mesmo ser uma história com começo, meio e fim… cabe a nós criarmos uma nova.

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Nota: 10 – Excelente!

Junho – O Mês Que Abalou o Brasil, 2014

Direção/Roteiro: João Wainer

Brasil

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12 Anos de Escravidão | Crítica

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     Na cerimônia do Oscar 2014, a apresentadora Ellen DeGeneres brincou dizendo que se 12 Anos de Escravidão (12 Years a Slave, 2013) não levasse o prêmio, os eleitores ali presentes seriam racistas. Isso pode passar a impressão de que foi uma forma de pressão para que o filme levasse a estatueta, que de fato houve, pelo forte tema abordado e com tantas praticas racistas que ainda persistem. A dúvida fica por conta dos méritos do reconhecimento: É um trabalho superestimado que “chegou lá” por exagerada influência externa? Ou é uma obra prima do cinema produzida e estrelada por grandes ícones de Hollywood? Guarde essa pergunta.

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     Steve McQueen (Fome, Shame) assina a direção no filme que conta a história real de Solomon Northup (Chiwetel Ejiofor), um homem negro livre do norte de Nova York que é sequestrado e vendido como escravo. Na primeira fazenda aonde foi parar, seu dono William Ford (Benedict Cumberbatch) se vê obrigado a repassa-lo para outro local após um sério incidente. Solomon passa então a ser propriedade de Edwin Epps (Michael Fassbender), um cruel fazendeiro, que nutre desejos por Patsey (Lupita Nyong’o), sua mais eficiente escrava na colheita de algodão.

     Adaptado do livro homônimo escrito pelo próprio Solomon Northup, 12 Anos de Escravidão acerta em não apostar no melodrama e retrata bem a situação dos homens livres que foram sequestrados para serem comercializados como escravos, prática muito usada nos Estados Unidos por volta de 1840. Mas peca num dos pontos vitais para o que julgo agregar qualidade ao material: Imparcialidade.

     Temos aqui a caracterização do homem branco demonizado, assim como as mulheres quando reagiam de forma cruel ao fato de seus maridos senhores escravistas usarem negras como instrumento sexual. Isso fica muito mais acentuado quando o único branco que vale o prato que come é retratado por um grande astro como Brad Pitt, um dos produtores, dando um toque um tanto forçado à sua participação, e o fato do seu nome estar até na sinopse oficial corrobora essa ideia já que sua participação é curtíssima. Parece inverossímil que nos doze anos que passou como escravo, Solomon não tenha se deparado com negros de caráter ruim. O mais próximo disso é a esposa do fazendeiro vizinho (Alfre Woodard), mas que tem suas ações justificadas. Nesse sentido, até Django Livre (2012) que é um filme para diversão se faz mais justo. A passagem do tempo não foi bem ajustada, o que também prejudica na experiência final.

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     O desempenho do núcleo principal é satisfatório, Michael Fassbender está surtado como Epps, assim como Chiwetel Ejiofor justifica sua indicação como melhor ator, junto com Lupita e sua Patsey. Os três estão muito bem entrosados e protagonizam as melhores cenas do longa, como a do enforcamento, onde um ser humano tenta sobreviver na ponta do pés, enquanto as pessoas ao fundo continuam seus afazeres normalmente. A violência do filme não soa gratuita pois as coisas se passaram daquela forma, então é razoável que não tenha amenidades, então prepare-se para ver como realmente pode ficar o corpo de uma pessoa chicoteada. Chorar durante o filme não é condenável também. Quem abusa disso é Eliza (Adepero Oduye), chora o tempo todo mas tem uma atuação teatral demais que pouco convence em seu derradeiro momento.

     A trilha sonora é simples e cativante, com cantigas contendo o ritmos básicos de estilos que eclodiram posteriormente. O som que acompanha o suspense da condição de Solomon no início destoa um pouco, parece que a intenção é nos assustar com a chegada iminente de um vilão de filme de ação… nada que prejudique nesse caso.

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     Retornando à pergunta inicial, 12 Anos de Escravidão foi apenas o melhor entre as opções da academia na época. Isso não significa grande coisa, mesmo assim o trabalho tira proveito pelo talento do elenco além da bela fotografia e música, enfim, quesitos técnicos que mostram evolução do diretor Steve McQueen.

Nota: 5 – Regular

12 Years A Slave

Direção/Roteiro: Steve McQueen e John Ridley

Estados Unidos

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